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Audiência pública sobre concessão da Hidrovia do Paraguai é marcada por alertas sobre seca extrema

Leonardo Cabral em 10 de Abril de 2025

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Audiência pública aconteceu no Centro de Convenções do Pantanal

O Centro de Convenções do Pantanal, no Porto Geral, foi palco, nesta quinta-feira, 10 de abril, da 2ª audiência pública, presencial e on-line, para discutir a concessão da Hidrovia do Rio Paraguai. Autoridades civis, militares e ambientalistas participaram do evento, que trouxe propostas que dividem opiniões.

Essa é a primeira concessão de hidrovia no Brasil a ser debatida em audiência pública, coordenada pela Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários). Para Dino Antunes Batista, secretário de Hidrovias do Ministério de Portos e Aeroportos (MPor), os trabalhos estão sendo conduzidos para que, até o final do ano, haja a “batida de martelo”, isto é, o leilão da concessão. Ele diz esperar que isso aconteça ainda este ano, o que possibilitaria ao concessionário assumir a partir de 2026.

Dino também mencionou que este é o grande projeto da secretaria e do ministério e que o ministro Silvio Costa deu orientação muito clara para que seja tratado como prioridade.

“A presença da concessionária é a forma mais eficaz de trazer resultados. Costumamos dizer que os rios no Brasil não são hidrovias, são rios navegáveis. Transformar isso em uma hidrovia significa colocar sinalização, remover bancos de areia, implantar sistemas de monitoramento – não apenas da navegação, mas também ambiental. Isso é ter uma hidrovia. Isso é garantir navegação segura. E, no nosso entendimento, a forma mais efetiva de concretizar isso, de transformar rios navegáveis em hidrovias de fato, é por meio das concessões. É por isso que, neste ano, teremos a primeira, que será justamente a da Hidrovia do Rio Paraguai”, explicou o secretário.

A proposta prevê a entrega de serviços de derrocagem, balizamento e sinalização adequados, construção de galpão industrial, aquisição de draga, monitoramento hidrológico e levantamentos hidrográficos, entre outros.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Dino Antunes Batista, secretário de Hidrovias do Ministério de Portos e Aeroportos

O secretário de Hidrovias também destacou a importância de as discussões acontecerem em Corumbá. “Estamos falando do projeto de concessão dos serviços necessários para a Hidrovia do Paraguai. Esses serviços não acontecerão em Brasília, acontecerão aqui. Por isso, é fundamental que tenhamos esse diálogo com a sociedade, para entender de que forma nosso projeto pode ser aprimorado. Este é um processo efetivo de escuta da população, para compreender suas dores, preocupações e também receber elogios ao que estamos fazendo”, disse.

Em relação aos impactos ambientais, o secretário afirmou que eles existem, mas garantiu que todas as ações são baseadas em estudos e pesquisas. Segundo ele, essa discussão ocorre durante o processo de licenciamento e envolve fatores ambientais, humanos e sociais, considerados fundamentais. Ressaltou, no entanto, que o foco da audiência é discutir as intervenções que serão realizadas, seja pelo Governo Federal ou por meio de uma concessão com a iniciativa privada, o que permitiria maior monitoramento ambiental e mais ações eficazes para mitigar impactos da navegação.

“Então, hoje, o foco é esse. Mas a discussão sobre os impactos sociais também ocorre no processo de licenciamento ambiental. Mesmo a concessão tem impacto na sociedade, pois ao trazer mais previsibilidade e segurança para a navegação, permite um maior desenvolvimento econômico. E desenvolvimento econômico é emprego, é renda. Isso é bom para todos. Por isso, acho que interessa à sociedade saber o que está acontecendo e apoiar nosso projeto, fazendo as críticas necessárias”, afirmou Dino Antunes Batista.

Trecho a ser explorado

O trecho a ser concedido tem extensão de 600 km e fica entre o leito do Canal do Tamengo, em Corumbá, e a foz do Rio Apa, em Porto Murtinho. A concessão terá duração de 15 anos, podendo ser prorrogada por igual período.

“Estamos fazendo estudos para seis trechos. O do Paraguai é o que avançou mais rápido. Estamos viabilizando uma navegação segura. E aqui quero destacar a importância da segurança, porque a navegação pode ocorrer com ou sem concessão. A legislação brasileira permite isso. Então, trata-se de uma decisão das empresas sobre a escolha da alternativa logística. Muito, por exemplo, do minério produzido aqui perto sairá pela hidrovia por escolha da empresa. O que a concessão traz é mais segurança para esse transporte. Estamos avaliando seis projetos. Também estudamos o Rio Madeira, a Hidrovia do Tapajós, do Tocantins, no sul do país, a ligação com a Lagoa Mirim, e o que chamamos de Hidrovia Verde, no Amazonas até sua foz”, explicou o secretário do MPor.

O transporte de cargas na Hidrovia do Rio Paraguai, após a concessão, está estimado entre 25 e 30 milhões de toneladas a partir de 2030, o que representa um aumento significativo em relação ao volume atual. No ano passado, a hidrovia transportou 7,95 milhões de toneladas, um aumento de 72,57% em relação a 2022.

Previsão de seca preocupa pesquisadores

A pesquisadora da Embrapa Pantanal, cedida ao Ministério Público Federal, Débora Calheiros, acompanhou a audiência. Segundo ela, o discurso foi positivo até certo ponto, já que destacou questões ambientais e o Pantanal. No entanto, demonstrou preocupação com a navegação durante a seca.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Pesquisadora tem preocupação com seca extrema, caso concessão seja aprovada

“O que eles chamam de perenidade e previsibilidade? Os 10 anos de seca da década de 1960 podem voltar naturalmente, e também podem ser intensificados pelas mudanças climáticas. Você pode ter os dois efeitos juntos. E a previsão dos hidrólogos é de anos de seca na região. Especialistas do INPE, da UFMS e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul apontam isso. Nossa preocupação é navegar durante a seca. Eles pretendem navegar 365 dias por ano e a navegação sempre existiu no Tramo Sul, sem a necessidade de dragagem. Talvez agora, com o cenário mais seco, as dragagens sejam mais necessárias. Mas o ponto central é: como navegar em anos de seca extrema, como em 2024? Antes, respeitava-se o período de seca. Agora, querem navegar também durante esse período, e essa é a nossa grande preocupação”, argumentou a pesquisadora.

Ela questiona o que a empresa concessionária fará para manter a lucratividade em anos seguidos de seca. “Temos que respeitar o Rio Paraguai para respeitar o Pantanal. Essa é nossa preocupação. Não sabemos se serão 10, 20 ou 5 anos de seca. Mas os especialistas preveem anos mais secos, inclusive este. Eles disseram que vão respeitar o meio ambiente e monitorar. Que, em períodos de seca severa, não colocarão tantos comboios. Então, é necessário seguir como sempre foi feito: respeitar o período de seca, realizar dragagens de manutenção quando necessário e nos pontos adequados. Antes eram três pontos, agora mencionam 33, depois falaram 14, depois 23. Não sabemos. É preciso estudo sinérgico e conjunto sobre essa dragagem. Mesmo sendo de manutenção, 33 pontos podem trazer impactos. Ainda estamos na fase de concessão, mas como operar com dez anos seguidos de seca? Como garantir a segurança financeira da concessionária?”, questionou a Débora Calheiros.

Ela ainda lembrou que os hidrólogos indicam a necessidade de estudos detalhados nos 33 pontos previstos para dragagem, mesmo que sejam de manutenção.

“Creio que haverá dragagem de aprofundamento também, porque na seca não será possível navegar sem isso. Há incoerências que precisam ser esclarecidas. Essa é nossa maior preocupação: a seca. A proposta ambiental agradou em parte, mas navegar na seca, ressalto, é a principal preocupação. Sempre se respeitou o período de seca. Também há relatos de aquisição de barcaças maiores, com motores mais potentes. Isso precisa ser verificado junto à Marinha e à Capitania dos Portos, pois há limites de dimensão de comboios para cada trecho do rio”, finalizou a pesquisadora.

Entre os serviços previstos, caso a concessão seja aprovada, estão melhorias em travessias e pontos de desmembramento de comboio, implantação dos sistemas de gestão do tráfego hidroviário – incluindo Vessel Traffic Service (VTS) e River Information Service (RIS) – e serviços de inteligência fluvial, nos primeiros cinco anos.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Audiência reuniu autoridades civis, militares e ambientalistas

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