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Em meio a centenas de andores de São João, herança da “mãe da cultura pantaneira” é guardada como relíquia

Leonardo Cabral em 23 de Junho de 2021

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Andor foi confeccionado no ano do falecimento de Helô Urt

A cada ano que passa os festejos do banho de São João se consolidam como uma festa única no País. Uma tradição secular, passada de geração em geração, em que os devotos levam os andores para banhar a imagem de São João Batista nas águas do rio Paraguai. É na noite de 23 de junho, véspera do dia do santo, que os festeiros descem a ladeira Cunha e Cruz, em meio a orações, pedidos, música, festa, alegria e agradecimentos. A última vez que isso aconteceu foi em 2019. Em 2020 e 2021, a festança foi cancelada por causa da pandemia da covid-19.

Cada andor, ornamentado, tem sua peculiaridade, seu tamanho, cor, forma e história. O que vale é manter a fé e a devoção ao santo. Entre os devotos está Sandro Asseff, um dos poucos que não levam o andor para o banho no rio, já que se trata de uma verdadeira relíquia. Tanto apreço é porque o andor é herança da saudosa Heloísa Urt, considerada a “mãe da cultura pantaneira”.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Sandro Assef diz que escolheu o andor porque era a bandeira de luta de Helô

Sandro diz preferir manter a privacidade em seu ritual de banhar a imagem de São João. “Eu mesmo vou até a piscina de casa e dou banho na imagem. Prefiro assim”, disse em poucas palavras se referindo ao andor que é feito de cetim vermelho, rosas de chitão, miolo em pedraria e filó branco. “Também, dia 24 de junho é o dia dele, não fujo do contexto”, completou com risos.

A atitude reservada também se justifica porque ele trabalha intensamente no dia 23 (é servidor da Fundação da Cultura) e, para manter intacto o andor, uma lembrança pra lá de especial que rememora a amiga que tanto lutou pela cultura local.

“Eu ganhei o andor após a partida de Helô, como todos a chamavam de forma carinhosa. Ele foi feito no ano em que ela faleceu, para que fosse a um estande da Fundação de Cultura em uma feira de Turismo. Eu trabalhava no gabinete da Fundação, ao lado dela esse ano e depois que ela partiu, o filho dela pediu para escolhermos uma lembrança. Fui direto ao andor de São João, que guardo com muito carinho e amor, não só pela devoção e fé, mas por ela também”, disse Sandro ao Diário Corumbaense.

Ele destacou que o andor tem um significado especial, pois entre tantas lutas culturais, Helô, jamais deixou de lado o Banho de São João. “Escolhi o andor por ser algo significativo e que era a bandeira de luta dela, o São João. O reconhecimento do Banho de São João como patrimônio no Estado e agora Nacional, começou na cabeça dela. Na época, para muitos era uma utopia e agora é realidade”, destacou.

Grande Mecenas da Cultura

Anderson Gallo/Arquivo Diário Corumbaense

Helô faleceu em 2011, aos 61 anos

“Ela era uma visionária, tinha uma visão muito avançada do que era e de como fazia cultura. Foi por isso que resolvi pedir o andor, pois seria algo que eu pudesse lembrar dela para sempre. Helô Urt era a grande ‘Mecenas’ da cultura local, defendia com unhas e dentes, brigava, era visionária”, completou Sandro ao relembrar a amiga e companheira de trabalho.

Ela foi a responsável por trazer de volta os carnavais antigos com a descida dos corsos, blocos das pastorinhas, frevo para a avenida General Rondon. Em 2006, ela idealizou o bloco Sandálias de Frei Mariano, que passou a abrir o carnaval de Corumbá na noite de quinta-feira. O que poucos sabem é que a letra da marchinha que espanta a praga do frei lançada à cidade, é de autoria de Heloísa.

Durante a gestão de Heloísa Urt na Cultura também foi criada a Noite da Seresta. Ela foi apoiadora do projeto Pôr do Som. Helô também pleiteou a volta de datas festivas como o aniversário da cidade e o Natal no Jardim da Independência. Como gestora da Cultura, ela também contribuiu para a organização do Arraial do Banho de São João ao cadastrar as famílias que promovem os festejos na cidade.

Heloísa Urt faleceu no dia 23 de novembro de 2011, aos 61 anos, no Hospital de Caridade de Corumbá, após um infarto. Ladarense e com uma personalidade marcante, Helô era conhecida pelo jeito autêntico de expor suas opiniões e defender seus pontos de vista.