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Feminicídio

Coluna Coisas da Língua, com Rosangela Villa (*) em 15 de Março de 2019

Caros leitores

A ideia era iniciarmos a coluna de 2019 falando de coisas agradáveis, após um carnaval de paz, que nos fez acreditar que é possível as coisas melhorarem na nossa cidade. Depois dos trágicos acontecimentos dos primeiros meses do ano, que nos abalaram profundamente - a tragédia de Brumadinho/MG, o incêndio no Centro de Treinamento do Flamengo, e a enchente em São Paulo, só pedíamos um carnaval que pudesse nos fazer esquecer por alguns dias tanto sofrimento e lágrimas. E ainda vivíamos esse estado de prazer, com o bom trabalho realizado pelas forças de segurança e com a própria conscientização dos munícipes, quando fomos surpreendidos por um brutal crime de feminicídio em Corumbá. E, mais recentemente, o açoite do desamor nos atingiu de novo com a barbárie na escola de Suzano/SP. 

Hoje, não consegui pensar em outra coisa a não ser no estado de espírito que nos consome pela comoção coletiva diante de tanto ódio, negligência, descuido. E neste significativo mês, a dor só aumenta ao registrarmos o elevado número de mulheres vítimas de violência física, psicológica e material no Brasil. Estamos vivendo dias difíceis, em que nem bem entendemos uma tragédia, ocorre outra. As palavras femicídio e feminicídio estão progressivamente difundidas, e o seu significado ainda sendo assimilado. As duas palavras estão associadas à ideia de matança de mulheres por homens, justamente por serem mulheres. 

A etimologia mostra que ambas vieram do latim femi, -cid, que quer dizer ação de quem mata ou o seu resultado, e do grego phemi, que significa manifestar seu pensamento pela palavra, opinar. Mas também é um neologismo ao vocábulo inglês femicide, que se refere a assassinatos de mulheres por razões de gênero. Nesse contexto, os autores se acham superiores às mulheres, impondo-lhes subordinação e nutrindo sentimento de posse; e quando contrariados passam rapidamente ao ódio e à depreciação da mulher, cometendo feminicídio – a perseguição e morte intencional da mulher, classificado como um crime hediondo no Brasil. 

Pela acepção dicionarizante de Antônio Houaiss, o termo femicídio significa a morte de mulheres em razão do sexo (feminino), e feminicídio, quando há conotação política envolvendo o assassinato, como foi o caso da morte, em 1999, de Dorcelina Oliveira Folador, prefeita de Mundo Novo/MS pelo PT, e, mais recentemente, o assassinato de Marielle Franco, vereadora do RJ pelo PSOL. Contudo, a palavra feminicídio ficou cristalizada no vernáculo para todo e qualquer crime de morte contra a mulher, tendo ou não motivação política, como o que vitimou a professora Nádia Sol, nossa ex-aluna da UFMS, no início desta semana. À língua, por meio das palavras, cabe o papel, nem sempre prazeroso, de dar nome aos fatos vivenciados pelo povo. Esse assunto entristece. Esperamos que a próxima coluna não tenha essa infortuna conotação social. Um abraço.

(*) Rosangela Villa é professora associada da UFMS e colaboradora do Diário Corumbaense.