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Por dentro da folia - Passistas, a resistência do samba!

Por Victor Raphael (*) em 07 de Fevereiro de 2020

O carnaval tem alguns elementos que caracterizam sua imagem no pensamento popular. Um chapéu panamá, um pandeiro… e passistas. Sejam eles masculinos ou femininos, as pessoas que têm a grande missão de sambar perante o público são a cara do carnaval das escolas de samba. 

Mas se engana quem acredita que a função de passista se resume a isso. Mesmo não sendo um quesito com notas discriminadas pelos jurados, a  atuação influencia, pelo menos, dois itens muito importantes para as escolas que pretendem ganhar o carnaval.

 

O primeiro elemento é o sub quesito Evolução, dentro do quesito Harmonia e Evolução. No desfile das escolas de samba, a ala de passistas fica posicionada estrategicamente antes ou depois da bateria. Além de ouvir melhor o ritmo para facilitar a dança, esta ala, especificamente, não tem a obrigatoriedade de cobrir os espaços com o mesmo rigor que as alas comuns do desfile, já que o samba exige um espaço maior para sua desenvoltura.

 

Portanto, isso faz dos passistas, os coringas dos diretores que coordenam o quesito evolução na entrada da bateria no box de recuo, já que o espaço deixado pela movimentação dos ritmistas é suprido dessa forma. Algumas escolas já usam, inclusive, o expediente de deixar a ala de passistas também no recuo, porque um dos momentos mais cruciais do desfile é a saída da bateria desse box e não é raro ver a escola andando enquanto a bateria sai, prejudicando assim a uniformidade do cortejo. Mais uma vez, com os passistas preenchendo possíveis espaços abertos, a nota do quesito tende a ficar preservada.

 

Para além das questões técnicas do carnaval, há ainda um elemento muito importante para que a ala de passistas seja mantida no desfile das escolas de samba. A forma como os desfiles evoluíram através dos anos provocou uma mudança clara na forma com que os componentes das alas comuns passam pela avenida. Era comum entre os anos 60 e 70 ver os componentes sambando felizes dentro das suas alas.

 

Com a adoção do tempo mínimo e um critério mais técnico para o julgamento dos quesitos, o samba em sua forma original foi deixado de lado, em detrimento do “arrasta-pé”, que hoje permeia todos os desfiles. Se por um lado, esse formato deixa mais à vontade os desfilantes que não sabem sambar, por outro, deixou o samba malemolente cada vez mais escassos nas passarelas.

 

Sobrou a ala de passistas, que carrega consigo a resistência da transformação do ritmo que marca o Brasil em dança. Os movimentos dos seus corpos são a memória daquilo que nos caracteriza. Muitas das rainhas de bateria que hoje estão em grandes agremiações (como as duas mais tradicionais, Portela e Mangueira) já fizeram parte desse importante segmento.

 

Falando especificamente de Corumbá, os desfiles têm mostrado cada vez menos a presença de passistas masculinos, que também são importantes para o processo de perpetuação desse gênero da dança. No Samba Corumbá, acontecido no último dia 1º de fevereiro, a escola de samba Marquês de Sapucaí exibiu um passista masculino. Tomara que surjam outros, pois quem ganha é o espetáculo.


(*) Victor Raphael é compositor e diretor da Liga Independente das Escolas de Samba.