Nelson Urt em 21 de Setembro de 2019
Alguns migrantes passam despercebidos por Corumbá e vão embora no anonimato, como uma sombra. Outros ficam, criam raízes, trazem luz, novos conhecimentos e ajudam a reconstruir a história da cidade. Neste segundo grupo cabe o professor, mestre e doutor universitário Marco Aurélio Machado de Oliveira, acreano de nascimento e campo-grandense por formação, mas há 27 anos em Corumbá, onde coordena o Circuito Imigrante, responsável pela Feira do Imigrante e propostas de ações públicas de recepção aos migrantes, imigrantes, refugiados.
Professor de História Moderna e no Mestrado em Estudos Fronteiriços da UFMS, Marco Aurélio critica os migrantes nacionais que chegam a Corumbá com o “discurso comprado” de que a cidade é distante e isolada. “Esse binômio é pejorativo e não bate com o real”, diz. “Uma cidade que tem um rio como o nosso, tem estrada, tem ferrovia, tem aeroporto funcionando não dá pra dizer que é isolada. E outra: é uma cidade distante de onde, qual o ponto de referência?”
Falta vontade e conhecimento, observa o professor. “Estou convencido de que quem profere isso são pessoas que não têm a menor vontade de romper com o distanciamento e isolamento, pessoas que não querem vínculos nem raízes com a cidade, então elas se distanciam de outras pessoas e se isolam dentro deste estereótipo”, constata. “Na verdade, isolados e distantes estão essas pessoas com relação à cidade”, afirma.
Pessoas que rompem com esse sentimento de isolamento acabam descobrindo os verdadeiros valores da cidade e passam a viver melhor, ampliando suas relações culturais e sociais.
Marco Aurélio acredita que esse tipo de aversão seja típico do migrante nacional, principalmente do sudeste e do sul do País. “Esses são mais resistentes a romper barreiras e mergulhar na realidade local. Já nordestinos e nortistas são mais abertos, e isso permite que construam uma ideia própria da realidade, sem aquele discurso comprado”.
Ele entende que Corumbá não se identifica com a xenofobia – a perseguição e ataques contra imigrantes – embora observe, vez por outra, discursos preconceituosos e racistas contra bolivianos nas redes sociais. “Apesar desses discursos, a cidade tem demonstrado uma impressionante plasticidade para receber migrantes internacionais. Desconheço crimes contra a vida ocasionados por xenofobia, que alguém tenha matado alguém por ser estrangeiro”, comenta.
Corumbá tem duas características que não se pode desprezar, conforme o professor: ser uma cidade de fronteira e ter um histórico de cidade portuária. “E as cidades portuárias ganham em liberalidade, em braços abertos, como Santos, como o Rio de Janeiro, e essa mentalidade portuária permanece em Corumbá, por isso é tão cosmopolita quanto provinciana, embora toda a engrenagem do porto tenha sido transferida para a rua Porto Carrero”, observa ao Diário Corumbaense.
Decadência é outro mito que o professor combate com veemência, criticando intelectuais que defendem essa tese. “Como é que intelectuais tão renomados aceitam isso!? São fantasias que se constroem sobre Corumbá, como a ferrovia, que citam como exemplo de decadência. Mas eu ouço o apito do trem todo dia. É o trem lotado de minério. Dizem que a hidrovia é decadente, mas vejo chatas saírem todo dia com nosso minério para fora. Essa ideia de decadente colou, mas não é real. Eu digo a eles (mestres e doutores) que é uma desculpa da qual estão se apropriando para o fato de estarem com preguiça de estudar Corumbá”.
Marco Aurélio viveu 22 anos em Campo Grande, onde se formou e prestou mestrado. Em Corumbá está completando 27 anos. O doutorado foi em São Paulo, onde morou durante dois anos. O sotaque, o falar e o andar rápido ainda são traços campo-grandenses, acredita. Mas já incorporou manias e maneirismos da vida calma e ao mesmo tempo culturalmente agitada de Corumbá, uma cidade que para ele possuiu uma dicotomia entre “o quente e o frio”. Aqui ele se casou de novo, com a corumbaense Jessica, com quem teve Francisco, o caçula que se juntou às irmãs Cléa e Larissa.
Em crônicas publicadas no seu recém lançado livro artesanal “Éramos o que somos”, o professor Marco Aurélio declara seu amor à cidade e lança um “olhar definitivo” sobre o lugar que o acolheu. “Corumbá me revelou provinciano, logo ela tão cosmopolita”, relata. “Corumbá não é pequena, é muito grande, e essa verdade fere o narcisismo de todo o Mato Grosso do Sul, talvez por isso, tão amada e tão invejada”.
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Marcelo Anjos: Bacana a história do professor Marcos, somente discordo quando menciona que os sulistas são acomodados com a logística de Corumbá, é o contrário aqui mirantes sulistas ( sudeste e sul) muitos são empresários ( lojas, indústrias e agro negócio). O problema que os governadores que são eleitos são criadores de gado e não enxergam o ramo industrial. Somos ricos em recursos naturais onde gera emprego, inclusive forçando os interessados a estudarem, pois somente assim poderá se empregar. O que necessitamos são de políticos de Corumbá deixarem de olhar para si mesmos e preocuparem se preocupar mais com o crescimento da cidade.
Jorge Ferreira: Entendo que o professor baseia sua tese a partir do seu círculo de convivência onde pessoas possuem essa capacidade de deslocamento, entretanto a maioria dos migrantes que aqui chegam não possuem essa capacidade, porém tal fato não é demérito algum haja vista que essas pessoas procuram justamente Corumbá e adjacências devido a essas peculiaridades pois evitam grandes centros que são caracterizados pela violência, alta densidade demográfica e estagnação de possibilidades relacionadas a novas oportunidades de empreendimentos, em suma, Corumbá é um refúgio para aqueles que ainda possuem ideais desbravadores!
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