Coluna Coisas da Língua, com Rosangela Villa(*) em 19 de Julho de 2019
Segundo estudos de Jean Aitchison (1993), diariamente entramos em contato com mais de 100.000 palavras, às quais somos expostos ou temos acesso por meio da fala, da escrita, da leitura e da audição. “Na leitura das notícias numa emissão de rádio, em que há poucas pausas, faz-se uso de 8000 a 9000 palavras por hora. Uma pessoa a ler em velocidade normal perfaz 14000 a 15000 palavras por hora. Deste modo, é provável que alguém que converse uma hora, ouça o rádio uma hora e leia uma hora, entre em contato com 25000 palavras durante esse período. Por dia, o total pode ascender às 100000 palavras”.
Nesse cenário, muitas palavras são conhecidas e outras nem tanto, pois muitos vocábulos apresentam mais de um significado no dicionário e outros tantos significados no vernáculo. Para além desse complexo universo da comunicação verbal, ainda nos resta conhecer a história e a origem de cada termo. Tais características dão conta de explicar a estrutura morfológica do vocábulo e sua etimologia. A morfologia refere-se à constituição e estrutura física das palavras, e a etimologia trata de sua origem. Registramos, ainda, os termos de origem indígena que fazem parte do nosso vocabulário. Essas palavras são encontradas nos campos da culinária, da medicina popular, da toponímia urbana, em nomes de cidades e de acidentes geográficos etc. Algumas são bastante conhecidas, tais como, Araçatuba: é possível que seja pela junção de araçá (planta arbustiva comum na região) + tuba (abundância); mandioca: do tupi mãdi'og ou mani-oca, que significa “casa de Mani”.
Conta a lenda que a indiazinha Mani morreu e sua mãe chorava sobre o seu túmulo, de onde teria nascido esse fruto; outros nomes para mandioca são macaxeira, aipim, castelinha, uaipi, mandioca-doce, mandioca-mansa, maniva, maniveira, pão-de-pobre, mandioca-brava e mandioca-amarga. Todas essas variações comprovam o caráter variável do idioma e o de que as línguas mudam. Comenta-se, assim, que o desaparecimento da língua implica uma perda de conhecimento importante e irrecuperável. Dizem, também, que as mudanças na língua são infecciosas, e Aitchison explica: por exemplo, os pais se queixam que os filhos aprendem a falar de forma horrível na escola (tiques, gírias…), mas é difícil impedir que eles adquiram a pronúncia dos amigos, pois seria como impedir de vestirem as mesmas roupas de sua estrela do rock. Afinal, pelo menos subconscientemente, os seres humanos imitam aqueles que admiram ou a quem desejam ser associados.
Ocorre que, na língua, há essa tendência natural de variação e mudança, tanto na pronúncia, como no significado e na construção da frase. Por exemplo, no Brasil não pronunciamos o c antes do t como em acto e actividade, como ocorre em Portugal. Em relação ao verbo haver, cada vez com maior frequência, os falantes, lá e cá, trocam a forma convencional havia por haviam, p.e., Havia muitos pães no cesto, por Haviam muitos pães no cesto, concordando o verbo com o nome. Na próxima semana continuaremos esse assunto.
(*) Rosangela Villa é professora associada da UFMS e colaboradora do Diário Corumbaense.