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Regulação de fronteira para urgência e emergência é debatida em audiência pública

Lívia Gaertner em 30 de Setembro de 2017

Fotos: Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Audiência pública contou com a participação de representantes do setor de saúde de Corumbá e da Bolívia

“Problemas e soluções no atendimento médico-hospitalar a estrangeiros no município de Corumbá” foi o tema da audiência pública proposta pelo vereador Domingos Albaneze, cuja formação e atuação no campo da Medicina, o fez levar para discussão uma realidade vivida cotidianamente, mas que gera situações bastante delicadas.

Cidade turística, Corumbá recebe uma infinidade de estrangeiros de toda parte do mundo, porém a situação que mais inflama essa discussão está atrelada à fronteira com a Bolívia, de onde se originam muitos pacientes para serem atendidos no Hospital de Corumbá, centro de referência na região.

O vereador não apresentou números justificando que “eles não são confiáveis”, já que a prática de uso de endereços e até documentos de brasileiros são usados como forma de conseguir atendimento, que não o de urgência e emergência, por parte de cidadãos bolivianos.

Juntamente com a Comissão de Saúde da Câmara Municipal de Corumbá, Domingos realizou uma série de reuniões com autoridades e profissionais da saúde nas cidades bolivianas da fronteira, Puerto Quijarro e Puerto Suárez, e detectou o que considera ser “o ponto nevrálgico” do setor: a urgência e a emergência.

“Tivemos reuniões prévias com representantes da Bolívia e uma das coisas que ficaram bem patentes é que precisamos de uma regulação”, disse ao exemplificar a proposta com uma situação. “Todo paciente que virá da Bolívia, terá que entrar com um sistema de regulação de fronteira. Isso servirá, primeiro, para receber o que temos meios de resolver, por exemplo, um traumatismo craniano não temos como resolver porque não temos um neurocirurgião.  Então, não temos porquê receber um paciente nessas condições aqui porque não teremos como resolver”, reforçou.

Em casos dessa natureza, o vereador explicou que a estrutura em Corumbá pode auxiliar de forma a oferecer condições clínicas para o transporte do paciente até o cento de referência da Bolívia na região, que é a cidade de Santa Cruz de la Sierra, distante cerca de 600 quilômetros da fronteira.

“Numa parceria com Corumbá a fim de treinar equipes bolivianas das cidades de fronteira junto ao SAMU (Serviço de Atendimento Médico de Urgência) para que eles tenham condições de transferir para a base principal deles, que é em Santa Cruz de la Sierra e nós faríamos a estabilização de paciente grave em nossa UTI para posterior encaminhamento até a capital do departamento boliviano”, propôs.

A implantação de um sistema de regulação na fronteira, segundo Domingos, agregará não apenas um tratamento mais eficiente, mas oportunizará a geração de dados fidedignos, tão importantes para a busca de recursos e políticas públicas entre os países.

Vereador e médico, Domingos Albaneze defende implantação de sistema de regulação

“Muitas vezes, por falta de contato entre as duas partes, o paciente já vem aqui para o Brasil em situação desesperadora, tornando-se um paciente de alto custo. É um ônus que pagamos por essa falta de diálogo. Com regulação teremos estatísticas fidedignas para irmos, inclusive, até à Brasília conversar com o Ministério das Relações Exteriores e apresentar esses números e termos parâmetros para reivindicar”, disse.

Regulação: interesse comum

Davi Yovio, subgovernador da Província de Gérman Busch, que engloba os municípios de Puerto Quijarro, Puerto Suárez e El Carmen Rivero Torrez, esclareceu que as autoridades têm interesse em desenvolver conjuntamente os protocolos para implantação da regulação proposta. Ele lembrou que, em alguns casos, a grande distância das cidades fronteiriças com a capital cruceña não deixa outra opção se não pedir ajuda ao Brasil.

“Quando temos um paciente de emergência, tentamos deslocá-lo para Santa Cruz de la Sierra, mas são seis horas de viagem por via terrestre, por isso recorremos a Corumbá, onde há uma estrutura muito melhor que a nossa. Agradecemos às autoridades que sempre nos socorrem de forma imediata porque imagine como estaríamos? Sabemos que o Brasil também enfrenta dificuldades na saúde, que é uma dificuldade em todo mundo. Com todo certeza, temos interesse em tudo que possa melhorar nossa relação”, afirmou.

Em cada uma das três cidades da província, há instalado um hospital, dentre os quais, o de Puerto Suárez, é considerado referência para a saúde da fronteira no lado boliviano. Entretanto, a unidade hospitalar está classificada como de saúde básica, situação semelhante a encontrada em Puerto Quijarro, onde o diretor do Hospital Príncipe da Paz, Jaime Gallardo, também vê como primordial a necessidade de regulação entre as cidades brasileiras e bolivianas.

“A preocupação nossa também é por fortalecer essa proximidade. Sabemos que nosso problema na saúde é muito mais acentuado que aqui porque somos de um nível primário e essa implicação está principalmente em equipamentos. Temos muitos bolivianos que vivem aqui (Brasil) e buscam diretamente o serviço brasileiro e isso nos incomoda porque eles desconhecem os trâmites. Eles precisam procurar o atendimento na Bolívia e, dependendo da necessidade, se for um caso de urgência/emergência, encaminharmos até Corumbá”, observou ao lembrar que o Hospital em Quijarro também realiza atendimentos a brasileiros residentes na Bolívia.

“Velha conhecida”

Presidente da Junta Interventora da Santa Casa de Corumbá, unidade hospitalar que acaba recebendo muitos desses estrangeiros, Antônio Cezar Santos Sabatel, frisou que essa situação é antiga e a regulação virá para ser uma aliada também dos profissionais da saúde.

Presidente da Junta Interventora do Hospital de Corumbá destacou que problema é antigo

“Desde 1986, observo que atendemos as pessoas e o que nós precisamos é normatizar esse atendimento. Algumas vezes, o paciente vem do território boliviano sem nenhuma informação para o colega médico que está na Santa Casa ou no Pronto-Socorro. Precisamos criar esse protocolo da urgência e emergência, principalmente”, disse ao destacar que o SUS – Sistema Único de Saúde – é um convênio público altamente fiscalizado pelas autoridades em todas as esferas e que não permite o atendimento de estrangeiro em situações eletivas, que são aquelas fora da situação de urgência e emergência.

O coordenador geral de Atenção em Saúde de Corumbá, médico Emerson Ferreira Moreira, destacou as peculiaridades da fronteira ao manifestar que a audiência pública realizada na sexta-feira, 29 de setembro, seja apenas a primeira de outras tantas que necessitam ser promovidas acerca do assunto.

“A fronteira é algo complexo tanto é que a UFMS criou um curso de mestrado em Estudos Fronteiriços por ser um assunto desconhecido até mesmo por nós que vivemos aqui e pelo poder central que não sabe das particularidades que aqui existem. Não devemos ter a pretensão de esgotar esse assunto, porque é um problema de saúde, institucional e até diplomático”, observou ao destacar que muitas sugestões apontadas ou que possam surgir, inevitavelmente, são destinadas às competências do Poder em outras esferas, sobretudo, a Federal.