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Devotos se agarram na fé em São João para vencer covid: “pensei em desistir da vida”

Leonardo Cabral em 23 de Junho de 2021

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Neta e avó agradecem a São João pela vida, após vencerem covid e dengue

A fé num momento de aflição. É nela, que alguns se apegam e se sentem mais fortes para vencer os obstáculos e enfrentar os problemas, inclusive doenças graves, como o coronavírus. Quando muitos pensam em desistir, acabam se reerguendo através da devoção. 

Greicy Kelly Ramos Maldonado, de 22 anos, sentiu na pele essa sensação. Ela contou ao Diário Corumbaense que pensou em se entregar para a doença devido aos sintomas que sentia, mas quando foi internada, pediu a São João, santo de sua devoção desde criança, para ajudá-la a vencer esse momento que resume como turbulento em sua vida. 

“Eu pensei em desistir de viver. Fiquei com muito medo da doença. Ainda mais quando tive que internar. Me afetou psicologicamente de forma intensa. É tanta coisa que se passa pela sua cabeça que realmente a única sensação é que você vai partir. Me vi assim, nos três dias que fiquei internada na Santa Casa, mesmo não precisando ser intubada, vi muita coisa acontecendo ao meu redor, além dos fortes sintomas que sentia”, relembrou Greicy destacando que o trabalho das enfermeiras e equipe médica também foi importante para a sua recuperação. 

Ela foi a primeira da família a ser diagnosticada com covid-19. No começo sentiu um resfriado, como ocorre com a maioria das pessoas. Logo depois, veio tosse e a tão temida falta de ar e, então, pelo medo e por não conseguir respirar, pediu para ser levada ao hospital. 

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Greicy falou que pensou em desistir de lutar pela vida, mas pediu forças a São João

“Além disso, eu não comia, não tinha vontade de nada. Não tinha forças. Era muito cansaço que sentia, nem fé mais eu tinha em nada. Mas, num momento tão difícil, mesmo não tendo forças, me agarrei e pedi com toda fé e devoção a São João Batista e Nossa Senhora Aparecida, para que eu pudesse me recuperar e voltar, pois mesmo sem ter a vontade de nada me veio logo na cabeça que eu tinha que lutar pela minha sobrinha e pelo menino que minha avó cria”, falou. 

A fé em São João e Nossa Senhora de Aparecida vem desde criança. Greicy sempre participou das festividades do santo em sua comunidade, na casa do festeiro Alfredo Ferraz, um dos mais tradicionais em Corumbá, na rua Monte Castelo, onde ela também mora. 

“Quando tive forças, pedi muito a São João e Nossa Senhora, para que eles intercedessem por mim e me dessem muita força para me reerguer. Hoje, mais do que nunca, sou agarrada a ele, faço aniversário no dia 25 de junho, um dia depois da celebração ao santo, então, vejo essa bênção da cura alcançada como uma nova chance de viver. Ele representa além de fé, proteção”, afirmou com a voz embargada a devota. 

A "Rainha do arroz" também se agarrou na fé 

Apelidada de “Rainha do arroz”, pela comunidade, por ter as mãos “de fada”, para fazer o arroz em todas as festas da comunidade, entre elas a de São João, a avó de Greicy, Fátima Vieira Ramos, de 62 anos, também encarou a internação. Mas, ela foi diagnosticada com dengue e permaneceu um dia a mais do que a neta no hospital. Foram quatro dias tratando a doença, que a fez perder a vontade de comer e ainda a fazia sentir fortes dores no corpo e nos olhos. 

“Eu sentia muita dor no corpo, na cabeça, não queria comer e nem beber água. Eu fui diagnosticada com dengue e por isso tive que ficar internada. Estava muito fraca e o desânimo era total. Mas aí, pedi a São João e a Nossa Senhora Aparecida, para que eles me dessem forças para me recuperar. Eles me atenderam e depois de quatro dias, saí do hospital”, contou Fátima. 

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Fátima agradece pela saúde da família e pela vida

Porém, o susto, não tinha passado. Logo depois de se recuperar da dengue, um novo diagnóstico fez a fé em São João ser mais forte. Três dias depois de sair do hospital, Fátima foi diagnosticada com covid-19. Hipertensa, cardíaca, com uma cirurgia no coração, e diabética, a “Rainha do arroz”, teve que ser muito forte, mais uma vez. 

“Depois que saí do hospital, alguns sintomas começaram a aparecer novamente, pensei que fosse consequência da dengue ainda, mas como tinha dor no corpo e vomitava muito, minha filha fez com que eu fizesse o exame para covid-19, e deu positivo. Ela me chamou e me contou bem calmamente e foi novamente que pedi pela proteção a meu São João e Nossa Senhora Aparecida”, relatou Fátima. 

Ela relembrou que um filme passou pela sua cabeça. “A gente pensa em tantas coisas ruins que podem acontecer devido a essa doença, meu medo maior era voltar ao hospital e ficar internada, mas sei que meu pedido a São João e Nossa Senhora foi atendido e eles não permitiram que eu voltasse. Mesmo com tantas comorbidades, permaneci em casa com o tratamento, cumprindo todos os protocolos até a minha recuperação e liberação do isolamento. Eu só pensava no meu menino e na minha família, pedindo com muita fé, devoção a São João”, mencionou Fátima segurando as lágrimas. Na família de dona Fátima apenas o marido não foi diagnosticado com covid.

A “Rainha do arroz” deixou um recado nesses tempos sombrios que rondam todo o mundo. “Temos que ter fé, se não tiver a fé, não somos nada. Primeiro agradeço a Deus, depois a São João e a Nossa Senhora de Aparecida. Eles sempre me ajudam. E, além disso, temos que sempre estar aqui para agradecer”, pediu. 

Mais um ano, ela e a família, seguindo todos os protocolos de biossegurança, estarão presentes na celebração a São João. “Será diferente pelo segundo ano por conta da pandemia, mas estarei aqui fazendo o arroz e ajudando no que for preciso ainda mais agora que eu e minha neta junto com toda minha família fomos livradas dessa doença. Agradecemos pela vida”, finalizou. 

Festeiro: a fé vai além 

O festeiro Alfredo Ferraz conta que esse momento é muito gratificante. “A devoção era algo familiar e se tornou comunitária. A fé da minha família é compartilhada e vivenciada pela comunidade, é imensa a alegria tê-las aqui testemunhando. Sinal da prova do poder de intercessão de São João na nossa vida, na vida da comunidade em geral, que crê e professa a fé em São João e vê os milagres acontecer. É tão bonita essa relação de fé e testemunho”, disse Alfredo. 

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

O festeiro Alfredo tem testemunhos do alcance da fé em São João

Ele faz questão de enfatizar que pelo segundo ano, diante do momento pandêmico, entende que as festividades não deverão acontecer, mas ressalta a fé em São João. “Isso que nos move a cada dia. É tão gratificante ver a pessoa testemunhando, isso e me dá mais coragem, para levar para frente essa devoção, mesmo com essa festa, reconhecida nacionalmente não sendo realizada, mas o mais importante é a renovação da fé em São João. O momento evidencia a fé que nos une cada vez mais”, frisou o festeiro. 

O Banho de São João este ano 

Quinze minutos. Esse é o tempo para que festeiros e devotos de São João levem a imagem do santo para o tradicional banho nas águas do rio Paraguai, na noite desta quarta-feira, 23 de junho, véspera do dia do santo, celebrado no dia 24. 

As medidas visam evitar aglomerações, seguindo determinações dos órgãos de saúde. Nesta noite, cada festeiro ou devoto poderá realizar o ritual do Banho do Santo, de forma individual ou, com no máximo, cinco acompanhantes, em um período de até 15 minutos. 

Essa tradição secular começa com a descida ocorre pela Ladeira Cunha e Cruz, tradicionalmente, chegando às margens do rio Paraguai. Esse momento é o mais expressivo para os festeiros e devotos. O ritual, que remete ao batismo de João Batista nas águas do rio Jordão, faz de Corumbá, única cidade do Brasil a manter uma tradição secular. 

O ritual do banho poderá ser realizado entre 05h e 21h, conforme Decreto nº 2.601 de 11 de junho de 2021, que estabeleceu toque de recolher no Município. É obrigatório o uso de máscaras.

O Banho de São João de Corumbá e Ladário foi reconhecido como Patrimônio Imaterial do Brasil. A aprovação unânime do registro aconteceu no dia 19 de maio, pelo Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

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