PUBLICIDADE
PUBLICIDADE

Número crescente de haitianos mobiliza sociedade civil de Corumbá em trabalho voluntário

Ricardo Albertoni em 13 de Julho de 2018

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Rede de voluntários se mobiliza para servir almoço - na maioria das vezes a única refeição do dia - aos cerca de 200/300 estrangeiros entre homens, mulheres e crianças

É por volta do meio-dia que os pequenos grupos começam a se formar próximo a um hotel localizado na rua Joaquim Murtinho, área central de Corumbá. Aos poucos, a frente do estabelecimento comercial, que acabou se tornando um ponto de referência para os haitianos que estão na cidade, vai se tornando local de encontro dos imigrantes que chegam ao Brasil vindos do Chile após atravessar a Bolívia irregularmente.

Diário Corumbaense

Imigrantes chegam ao Brasil vindos do Chile após atravessar a Bolívia irregularmente

A garagem do hotel, que também serve de abrigo para muitos que se encontram em situação de vulnerabilidade, é o local onde o almoço -  na maioria das vezes a única refeição do dia - é servido aos cerca de 200/300 estrangeiros entre homens, mulheres e crianças. “Não vamos deixar uma pessoa dormir no relento, queríamos que todos se conscientizassem e ajudassem”, explicou Enilda Barbosa Ripari e Edson Martinez, proprietários do hotel.

No espaço cedido, entidades civis e religiosas se revezam diariamente no preparo da alimentação sob coordenação da Pastoral da Mobilidade Humana que trabalha com a realidade imigratória da fronteira. Além de oferecerem a alimentação, os voluntários acabaram formando uma verdadeira rede de ajuda humanitária que também fornece abrigo em hotéis e imóveis particulares. O número de haitianos é tão grande que mesmo com boa parte da sociedade se mobilizando, muitas vezes os espaços não são suficientes.

Se espremendo entre as centenas de estrangeiros na fila do almoço está uma família: Edens, de 26 anos, a esposa Rosemica e a filha Edmica, de cinco anos. Ao Diário Corumbaense, meio desconfiado, ele disse que chegaram à cidade há duas semanas e contam com as doações para se alimentar. O objetivo é conseguir sair de Corumbá e chegar até onde estão parentes em outro estado do País.

A história é a mesma relatada pela maioria. Na rodoviária, Luma Firage, de 25 anos, contou à reportagem que a busca por um trabalho o motivou a fazer a viagem ao Brasil. Em um básico espanhol – as línguas faladas pela maioria da população são o crioulo e o francês - ele explicou que passou cerca de cinco meses no Chile antes de atravessar a Bolívia em direção à Maringá, no Paraná, onde estão irmãos, primos e amigos, segundo ele.

Por que os haitianos estão vindo para o Brasil?

Para entender esse processo é necessário voltar até 2010, quando um  grande terremoto atingiu o Haiti, de mais de 10 milhões de habitantes, localizado na América Central. O País sempre foi marcado por inúmeros problemas socioeconômicos devido a uma série de governos ditatoriais e golpes de estado, entretanto, o desastre natural acabou acentuando os problemas de uma região em que aproximadamente 60% da população é subnutrida e mais da metade vive abaixo da linha da pobreza.

Hoje, muitos que buscaram o Brasil como refúgio na época, já se encontram instalados e na maioria das vezes é essa história de reconstrução que motiva a viagem de grande parte da população haitiana em direção ao maior país da América do Sul. O objetivo de muitos é encontrar parentes em estados da região Sudeste e Sul. Coordenando a “rede de assistência” através da Pastoral da Mobilidade Humana, o missionário scalabriano, padre Marco Antônio Ribeiro, explicou que o fato de os viajantes cruzarem a Bolívia sem serem notificados intriga, mas, que é necessário que a sociedade acolha essas pessoas oferecendo condições durante sua passagem pela região.

“Imagina passar por todo um país sem ser notificado, então, alguma realidade estranha está nesse contexto. Sei que nossa cidade carece de recursos, mas é uma realidade que está à nossa porta, não tem como devolver, temos que dar uma resposta à altura sem violar os direitos humanos e garantir o mínimo de condição para essas pessoas que no momento estão na nossa cidade”, disse.

Um dos pontos de acolhimento dos haitianos na cidade é o imóvel conhecido como “Vasquinho” localizado na ladeira José Bonifácio. De propriedade particular, o prédio serve como alternativa provisória para abrigar os estrangeiros, principalmente durante as noites frias registradas em Corumbá.

 “Estamos fazendo aqui uma ajuda humanitária, uma parte pessoal. Fizemos o Moinho Cultural como um ponto de entrega de algumas doações logo no início, temos o prédio 'Vasquinho' que disponibilizamos em um primeiro momento, sabemos e reconhecemos que lá não é um lugar apropriado, mas estamos fazendo parte de uma rede humanitária aqui em Corumbá”, explicou a diretora-executiva do Moinho Cultural, Márcia Rolon, que antecipou que existe o planejamento de ampliar o auxílio com o início de uma campanha para criação de um local próprio para atendimento.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Voluntários formaram uma verdadeira rede de ajuda humanitária que também fornece abrigo em hotéis e imóveis particulares

“O Moinho recebe doação da empresa J. Macêdo de trigo, então, estamos disponibilizando essas doações. Além disso, a instituição tem uma rede grande de amigos que o abraçam e também vieram consequentemente abraçar essa causa, mas é algo mínimo que estamos fazendo. Na verdade precisa ter um olhar administrativo dos órgãos públicos porque eles estão de passagem por Corumbá, não são pessoas que querem ficar aqui, e aí existem vários entraves burocráticos que acontecem. Como nós somos de uma rede humanitária não podemos simplesmente fechar as portas. Como ONG (Organização Não Governamental), fazemos esse papel dentro do possível, mas sabemos que não é o ideal”, afirmou.

“Estamos trazendo a Fraternidade Sem Fronteiras, que é uma ONG de Mato Grosso do Sul que tem expertise pra isso e estamos à frente de uma campanha junto com o Wagner Moura para tentar mobilizar empresários e construir um local de passagem, pois, só o albergue municipal não dá conta, ele atende alguns, mas atende muito a população de rua também. Na verdade a gente está nessa roda tentando acolher em várias frentes”, adiantou.

Doações

A rede de assistência coordenada pela Pastoral da Mobilidade Humana está centralizando o recebimento das doações. Os interessados em contribuir com alimentos, roupas, serviços ou saber como auxiliar de outras formas podem procurar a sede da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, que fica localizada na rua Vinte e Um de Setembro, no bairro que leva o nome da santa.

“Estamos reunindo essas doações, organizando voluntários e fazendo uma escala de quem vai fazer os almoços. Reunimos as doações e distribuímos as responsabilidades da atividade no dia para poder servir todo esse fluxo que vem para almoçar no hotel. Precisamos de todos os tipos de doação, às vezes é pra comprar algo que faltou, uma mistura, ou tempero, materiais descartáveis. Estamos precisando de doações de todos os tipos. Temos distribuído bem as atividades, oneramos bastante algumas comunidades da Paróquia que são as que mais se disponibilizaram a fazer, mas estão aparecendo outros grupos da sociedade nos auxiliando como a União Regional Espírita, entre outras entidades. As pessoas podem entrar em contato para que participem como voluntários, se tiver um fogão industrial e consigam fazer alimento para um grupo grande é só colocar à disposição que marcamos, não só para fazer, mas também quem quiser ajudar a distribuir, precisamos de toda a ajuda”, pediu padre Marco Antônio.

Comentários:

Meire Hellen Pereira Barbosa: Realmente precisamos fazer algo .tenho na minha casa 5 hospedes haitianos .sei como esta dificil para todos