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Audiência pública debate estratégia articulada para atender haitianos que chegam em Corumbá

Rosana Nunes em 03 de Agosto de 2018

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Representantes de entidades e órgãos públicos participaram da audiência pública

Audiência pública realizada pelo Ministério Público Federal, reuniu na tarde desta sexta-feira (03) no auditório da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, autoridades e representantes de diversos setores, como Pastoral da Mobilidade Humana; Prefeitura Municipal; Ordem dos Advogados do Brasil; Defensoria Pública e Polícia Federal, para discutir o aumento do fluxo de haitianos pela fronteira da Bolívia com Corumbá.

A audiência foi aberta a toda a sociedade, com participação dos próprios haitianos que estão na cidade. Entre eles, Dulce Duverlus, de 42 anos, que chegou em Corumbá na quinta-feira (02) com a esposa, Rosilene, de 32 anos, e o filho Duvensley, de 5 anos. Dulce contou ao Diário Corumbaense que viveu por dois anos em Santa Bárbara D'Oeste, no interior de São Paulo, onde trabalhou como pedreiro. Ele voltou ao Haiti para buscar a mulher e o filho e agora não consegue seguir viagem para a cidade paulista porque teve dinheiro e documentos roubados na Bolívia. "Quero voltar para Santa Bárbara em busca de uma vida melhor para minha família, mas estamos com esse problema agora", disse. A família está abrigada na Casa de Passagem do Município.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Dulce Duverlus (com o filho no colo) e a esposa, estão sem dinheiro e documentos para seguir viagem para o interior paulista

Do começo do ano até agora, Corumbá já recebeu cerca de 1,5 mil haitianos, de acordo com a Pastoral da Mobilidade Humana. Mas foi nos meses de junho e julho que ocorreu o maior fluxo de imigrantes. Sem estrutura no Município para atendê-los, entidades civis e voluntários se juntaram à Pastoral numa rede de assistência, oferecendo alimentação e abrigos provisórios. A Polícia Federal, que durante algum tempo limitou o número de atendimento diário, teve que reforçar a equipe para reduzir a grande demanda. Uma vez notificados pela PF, os haitianos têm 60 dias para se regularizarem ou deixarem o País.

Quase todos os haitianos que chegam pela fronteira, têm Corumbá apenas como um corredor para chegar a outras cidades e estados. A maioria segue viagem para São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Minas Gerais, principalmente. Hoje, segundo o padre Marco Antônio Alves Ribeiro, coordenador da Pastoral da Mobilidade Humana, estão na cidade cerca de 50 imigrantes, pelo menos trinta deles, só não seguiram viagem ainda porque estão sem dinheiro. Para ele, o recente aumento no fluxo deixou clara a necessidade de ações práticas para receber os imigrantes.

"Espero que essa audiência pública nos ajude a nos preparar para ser fronteira, porque a qualquer momento pode chegar outro fluxo e como vamos fazer? Ainda não estamos preparados para abrigar e alimentar tanta gente. Porque a solidariedade tem um momento pontual, passou esse momento, ela também cessa. Não podemos seguir apenas com a caridade, temos que ter políticas públicas que vejam Corumbá como uma fronteira, por onde entram pessoas e que possam ser preparadas estruturas que deem dignidade à esses imigrantes", destacou o padre.

A Prefeitura de Corumbá, por meio das secretarias de Saúde, Assistência Social, Segurança, Cidadania e Direitos Humanos, esteve representada no encontro. A assessora de políticas sociais da Secretaria de Assistência Social, Adelma Galeano, enfatizou que o Município precisa de apoio nas esferas estadual e federal para montar a estrutura de atendimento, mas algumas medidas foram tomadas para amenizar a situação.

"Nossa Casa de Passagem tem vagas para 20, 22 pessoas e hoje estamos abrigando famílias inteiras. Abrimos o Centro Pop (que atende moradores em situação de rua) para fazer cadastramento e sabermos quem são os imigrantes, quantos são e qual realmente é a necessidade de cada um deles. Foi pactuado que todos os haitianos que chegam em Corumbá vão para o Centro Pop. Não temos verba específica para atendê-los, então pegamos a própria equipe da Prefeitura e estamos fazendo um revezamento, atendendo de 07h30 às 19h com esse cadastramento e encaminhamento", frisou Adelma. "O Centro Pop também foi aberto para que os haitianos façam a higiene pessoal, lavem roupas, façam lanche. Agora temos uma pedagoga para que seja feito um 'serviço de convivência'. Depois, eles são encaminhados para a Polícia Federal para que façam o visto. Corumbá precisa ter um atendimento diferenciado por ser área de fronteira e isso já foi colocado para as autoridades estaduais e federais", completou.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Professor Marco Aurélio, do Circuito de Apoio ao Imigrante, sugeriu medidas que podem ser executadas em curto e médio prazos

Ações de curto e médio prazos

O professor do Campus Pantanal da UFMS, Marco Aurélio Machado, que integra o Circuito de Apoio ao Imigrante, explicou na abertura da audiência pública, que após mudanças na legislação de imigrantes pelo governo do Chile e a concorrência com a mão de obra venezuelana, os haitianos passaram a optar pelo Brasil e Corumbá, por ser fronteira e estar no centro do Continente, entrou na rota pela maior facilidade de acesso.

"Nesses últimos meses, a cidade não viveu crise humanitária, pelo contrário, o que vimos foi a solidariedade de muita gente que se uniu para ajudar na assistência aos haitianos. Porém, ficou claro que o Município sozinho não dá conta, é preciso a elaboração de uma estratégia articulada do poder público (municipal, estadual e federal)", destacou o professor.

Entre as medidas sugeridas estão: sistema de monitoramento para saber quantos são e onde estão; definição de abrigo e encaminhamento; criação do Centro Integrado do Migrante Refugiado e Apátrida que definirá os níveis de vulnerabilidade do imigrante quando ele chegar; geração de dados consolidados que vão nortear ações e definição de um local de abrigo quando houver aumento do número de imigrantes.

A procuradora da República, Maria Olívia Pessoni Junqueira, destacou a este Diário a importância do encontro para se chegar a medidas práticas de atuação. "Reunir a população, a sociedade civil que trabalhou ativamente no momento de crise, as autoridades públicas competentes, é importante para que se estabeleça uma rede de articulação que seja capaz de criar soluções a curto e médio prazo para enfrentar a questão. Esse é um fluxo que já existe, a situação dos haitianos revelou que o município de Corumbá não está preparado. Olhando os números da Casa de Passagem, a gente vê que é frequente a quantidade de estrangeiros acolhidos, o próprio Centro Pop atende os estrangeiros, então, o nosso município é de fronteira seca, em que as pessoas, às vezes, entram aqui sem ainda terem se regularizado. Isso demanda políticas públicas para estarmos  preparados para acolher, orientar, uma rede que funcione para lidar com todas essas questões", concluiu.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Procuradora da República, Maria Olívia Junqueira, destacou importância de buscar soluções conjuntas

 

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